Os intensivistas Silvia Prado e Julio Navarro transformaram luto em luta e passaram a atuar no enfrentamento à violência policial, após perder o filho em abordagem da PM
Família em momento de lazer durante viagem – Créditos: acervo pessoal
No próximo dia 13 de junho, durante o 1º Congresso do Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp), o casal de médicos intensivistas formado por Silvia Mônica Cardenas Prado e o Julio Cesar Acosta Navarro será homenageado com uma menção honrosa a respeito do trabalho que vêm realizando no enfrentamento à violência policial no Brasil. Desde novembro de 2024, quando o filho, Marco Aurélio Cardenas Acosta, de 22 anos, foi morto durante uma abordagem da Polícia Militar em um hotel na Vila Mariana, zona sul da capital paulista, Silvia e Navarro transformaram a dor em luta coletiva, que travam ao lado de outros familiares de vítimas de execuções cometidas por agentes do Estado.
Desde o assassinato do filho, o casal tem conseguido espaços importantes para denunciar a letalidade da polícia militar no Brasil. Navarro já esteve ao lado do juiz do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, falando sobre o tema; apoia o movimento que pede a federalização dos casos de violência policial dirigido por entidades sociais, sindicatos e lideranças negras; e esteve presente em audiência pública que debateu a escalada da violência policial no estado de São Paulo, realizada na Assembleia Legislativa (Alesp) em fevereiro, sob coordenação do deputado estadual Carlos Giannazi. O encontro reuniu familiares de vítimas, ativistas, juristas e especialistas em segurança pública.
Em conversa com o Simesp, Navarro conta a sua trajetória na busca por justiça não só pelo seu filho, mas por todas as vítimas da violência policial, que ele classifica como uma “guerra civil contra pessoas pretas, pobres e periféricas”.
Por Luciana Mendonça
Simesp: Qual é a relevância do apoio de outros médicos e de entidades como o Simesp na sua luta?
Julio Navarro: A violência policial não deve ser de interesse apenas das pessoas que perderam entes queridos. Esse é um assunto que deve envolver toda a sociedade. Me sinto grato e confortado quando sei que entidades médicas são solidárias ao momento que estamos vivendo porque somos uma família de médicos, meu filho ia começar a residência em neonatologia, então, ser acolhidos pelos colegas de profissão, que nos apoiam nesta jornada, é muito importante.
Simesp: Desde novembro, o senhor e sua esposa têm liderado uma importante luta por justiça. O que motivou essa decisão de transformar a dor pessoal em ação coletiva?
Julio Navarro: Esta proximidade com familiares de outras vítimas da Polícia Militar tem sido muito significativa. Nós compartilhamos nossas histórias, lembranças e cada vitória conquistada. Na semana passada, por exemplo, uma mãe conseguiu acesso às câmeras dos polícias envolvidos na morte de um filho. Individualmente a espera por cada etapa do processo pode ser muito desanimadora, mas juntos nos fortalecemos e comemoramos cada vitória rumo à justiça.
Simesp: Quais os próximos passos da luta por justiça por Marco Aurélio?
Julio Navarro: A Polícia Civil pediu a prisão preventiva do policial acusado de assassinar Marco Aurélio. O inquérito policial que apurava a morte foi concluído no dia 3 de janeiro, pelo Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP). O judiciário negou o pedido de prisão, e o policial militar segue no exercício de suas funções sem nenhuma sanção. Por negar a prisão do policial, a magistrada que publicou essa decisão foi denunciada ao Conselho Nacional de Justiça e está sob investigação. Aguardo um retorno desse processo há três meses.
Simesp: Como vê o papel do Estado — nas suas diferentes esferas — no combate à violência policial e na reparação às vítimas?
Julio Navarro: O enfrentamento à letalidade policial no Brasil exige não apenas justiça individual, mas mudanças estruturais profundas que garantam o direito à vida de toda a população preta, pobre e periférica. Meu filho era pardo, suas feições lembravam nossa ancestralidade andina. Não posso deixar de pensar que a abordagem policial, em seu caso, também teve um elemento xenofóbico. Por sermos médicos, somos recebidos e ouvidos com mais facilidade, que a nossa voz ecoe o pedido de justiça de cada mãe, mulher, irmã, tia, parentes e amigos vitimizados pelo Estado e sua polícia.
Violência policial
A letalidade policial no Brasil tem apresentado números alarmantes. Segundo dados do 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2023, foram registradas 6.393 mortes por intervenções policiais, o que representa 3,1 mortes por 100 mil habitantes. Desse total, 82,7% das vítimas eram negras, e 71,7% tinham até 29 anos de idade.
No estado de São Paulo, a situação é particularmente preocupante. Informações do Ministério Público indicam que, em 2024, foram registradas 814 mortes por intervenções policiais, um aumento de 61,5% em relação ao ano anterior. A capital paulista lidera a quantidade de mortes por agentes, com 244 mortes, seguida da Baixada Santista com 166 vítimas, e a Grande São Paulo, também com 166.
Participe do 1º Congresso do Simesp
Nos dias 13 e 14 de junho, vamos nos reunir para debater esses desafios e construir soluções coletivas que garantam dignidade, valorização e estabilidade no exercício da profissão.
Convidamos você, médico, a participar dessa luta, inclusive, como delegado.
Participe, compartilhe sua vivência e ajude a transformar essa realidade com a força da nossa categoria.
Seja parte ativa dessa luta!
⚠️ Prazos importantes
📅 Inscrição de delegados(as): de 5 de maio a 10 de junho
📅 Credenciamento: até às 10h do dia 14 de junho
📅 Envio de teses e moções: de 10 a 14 de junho (até 15h)
📩 Inscreva-se pelo e-mail: diretoria@simesp.org.br