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Organizações sociais causam o desmonte da saúde de Guarulhos

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15/10/2018 | Notícia Simesp

Organizações sociais causam o desmonte da saúde de Guarulhos

O processo de terceirização dos serviços de saúde de Guarulhos, iniciado com a gestão do atual prefeito Gustavo Henric Costa (Guti), desestruturou toda a rede de assistência da cidade. O Hospital Municipal de Urgências (HMU) e o Hospital Municipal da Criança e do Adolescente (HMCA) deixaram de ser retaguarda de especialidades. Hoje, o município não tem mais condições de realizar cirurgias eletivas básicas, como hérnia e fimose, tendo que encaminhar os casos para a Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde (CROSS), que deveria receber apenas casos de alta complexidade. Para piorar a situação, em agosto a nova secretária da pasta, Ana Cristina Kantzos, assumiu que o orçamento para a saúde já se esgotou este ano, em reunião com o Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp).

Para se ter uma ideia da gravidade da situação, diversas especialidades deixaram de existir no processo de entrada e trocas de organizações sociais (OSs), como a ortopedia para locais específicos do corpo. Por essa razão, a fila de espera para uma consulta para problemas de joelho, pé e tornozelo na cidade chega a mais de cinco anos.

Outros serviços desestruturados foram otorrinolaringologia, neurologia infantil e oftalmologia. A espera deste último, para consultas infantis, é de 3 anos e meio, anteriormente a fila já era grande, de 2 anos. Para os adultos, a espera que era de 8 meses passou para 2 anos. (Veja tabela).

Além disso, os médicos já foram informados que a acupuntura também deixará de existir na cidade como “solução” para a falta crônica de insumos. “Nesse caso, os profissionais seriam deslocados para outras áreas no município e a fila de acupuntura seria extinta, reduzindo de forma artificial a fila geral do município”, explica Eder Gatti, presidente do Simesp, que já tenta dialogar com o prefeito desde o início de sua gestão, mas nenhum problema foi resolvido.

Também foi extinto o acompanhamento de médico no pós-operatório dos pacientes das cirurgias de urgência. Além disso, como a retaguarda de cirurgias eletivas foi desestruturada, as filas também estão cada vez maiores. Para procedimentos urológicos e vasculares, a espera é de 2 anos e meio. Já as cirurgias infantis levam 1 ano e 7 meses para serem realizadas. Em reunião com o Simesp, uma médica da rede de Guarulhos relatou que um paciente de seis anos com fimose não pode ser operado por falta de vaga de cirurgia pediátrica. “É um absurdo. As crianças de Guarulhos não podem fazer de forma oportuna e pública cirurgias simples”, denuncia Gatti.

Calote e contratação duvidosa
A Prefeitura de Guarulhos e a organização social (OS) Instituto Gerir decidiram rescindir o contrato para a administração do Hospital Municipal de Urgências (HMU), Hospital Municipal da Criança e do Adolescente (HMCA) e da Políclinica Paraventi em agosto. O problema é que a OS deixou a administração dos serviços devendo três meses de salários aos médicos, referentes aos meses de maio, junho e julho. De acordo com Gatti, a prefeitura e a OS não assumem a responsabilidade pela falta de pagamentos e quem paga por isso é o profissional que se dedicou à saúde do município. “Independentemente dos intermediários, o bom funcionamento da rede de saúde é responsabilidade da prefeitura, que deveria resolver a situação”.

Com a saída do Instituto Gerir, o HMU passou a ser administrado pela Santa Casa de Birigui, o HMCA pelo Instituto de Desenvolvimento de Gestão, Tecnologia e Pesquisa em Saúde e Assistência Social (IDGT) e a Paraventi voltou para a administração da prefeitura, fragmentando ainda mais a gestão dos serviços.

Assim que assumiram a administração, as novas organizações sociais buscaram contratar médicos sem vínculo formal de trabalho via WhatsApp, deixando a situação propensa a novos calotes, o que já aconteceu em setembro, quando os profissionais do HMU receberam o pagamento apenas de sete dias de trabalho, quando atuaram durante o mês de agosto inteiro.

“A Santa Casa de Birigui já se mostrou inexperiente assim que chegou à cidade, realizando pagamento com valores errados e deixando outros médicos sem receber. Guti colocou organizações sociais que desestruturaram toda a rede de referência que o município tinha e, para bagunçar ainda mais tudo isso, existe esse calote aos médicos que estavam trabalhando e prestavam serviço para a Gerir”, explica Gatti. Ainda em 2017, os atrasos salariais já aconteciam nos três serviços terceirizados do município, quando o Instituto Gerir não pagou os salários referentes aos meses de outubro e novembro.

Primórdios do sucateamento

Em abril deste ano mais de 100 pessoas, entre médicos, demais profissionais da saúde, representantes de entidades e moradores de Guarulhos realizaram ato em frente à Prefeitura da cidade por melhorias na saúde que já estava ruim, com falta de medicamentos e insumos básicos.

Em maio de 2017 o Instituto Gerir passou a ser responsável pela gestão dos três serviços de saúde terceirizados do município e pediu para que médicos se desligassem de seu vínculo público ou pedissem licença não remunerada para que aderissem à empresa como pessoas jurídicas (PJs), o que é caracterizado como fraude trabalhista. À época, o Simesp recomendou aos médicos que eles não abrissem mão de seus vínculos empregatícios conquistados por concurso. A atitude da OS foi apontada como sendo uma determinação da própria prefeitura, o que foi negado pelo então secretário da Saúde, Sérgio Iglesias.

De acordo com Gatti, essa situação foi o que deu início à desestruturação das equipes de especialistas da cidade, pois os profissionais que mantiveram seu vínculo público foram realocados em posições que não correspondiam à sua especialidade e os que aderiram à OS também foram redistribuídos de acordo com plano da então nova administradora.

Ainda em novembro do ano passado, o Tribunal Regional do Trabalho 2ª Região decidiu suspender o contrato de gestão entre a Prefeitura de Guarulhos e o Instituto Gerir, além de pedir o afastamento imediato da organização por entender que a OS desrespeita a legislação trabalhista. A decisão foi tomada mediante ação movida pelo Ministério Público do Trabalho após denúncias por parte do Simesp, do Sindicato dos Trabalhadores na Administração Pública Municipal de Guarulhos (Stap) e de vereadores da cidade. Entretanto, a liminar foi derrubada pelo presidente do Tribunal, Wilson Fernandes, por entender que a revogação foi necessária para não afetar a saúde da população.