Um dos curadores da mostra, Rodolfo de Athayde, lembra que “para ilustrar 13 séculos de uma civilização que conseguiu criar uma arte de caráter tão próprio e diverso, ao mesmo tempo com traços inconfundíveis, foi negociado um conjunto de obras que abrange um amplo leque de objetos úteis e decorativos, por meio dos quais é possível admirar o refinamento e os conceitos estéticos aplicados pelos artistas-artesãos, em sua maioria anônima”. Rodolfo de Athayde divide a curadoria da mostra com Paulo Daniel Farah, diretor da BibliASPA. O acervo exposto no BB é pouco visto internacionalmente e inédito no Brasil.
História da cultura islâmica
A mostra está organizada por salas temáticas, respeitando um sentido cronológico, mas sem se submeter ao rigor temporal. A ideia é proporcionar emocionante viagem por 13 séculos de história da cultura islâmica, que nasce na Península Arábica e se expande com velocidade até dominar o território que foi da Península Ibérica até o pé do Himalaia, absorvendo (e com isso houve o sincretismo) culturas diversas dos povos conquistados ou convertidos. As salas têm a paleta típica da arte do Islã, nas cores verde e azul (mesmo tom que originou os azulejos portugueses).
Na cenografia, estão presentes padrões copiados do nicho direito da Grande Mesquita de Damasco, marco da primeira etapa da arte islâmica, construída entre 706 e 715 e decorada sob influência bizantina.
Há ambiente interno com motivos islâmicos, chafariz e a marca da exposição “Islã: Arte e Civilização”, criada pela designer
Bete Esteves.
Um portão cenográfico da arquitetura muçulmana recebe o público na entrada da exposição. Diferentes mapas e a linha do tempo contam os períodos de expansão territorial do Islã, destacando os mais importantes acontecimentos vinculados aos territórios islâmicos. Na sequência, há plantas arquitetônicas das principais mesquitas, como a Mesquita dos Omíadas, em Damasco, a Mesquita da Rocha, em Jerusalém, e a Mesquita Azul em Istambul, com projeção em 360° graus.
Um dos grandes destaques da mostra são os fragmentos originais do Palacio Al Hair Al Gharbi, na Síria, com peças que evidenciam a influência greco-latina, e vitrines com objetos de cerâmica e vidro, de períodos do século 7 ao 13, como lâmpadas de azeite em cerâmica azul esmaltada. O fundo da sala é dominado por uma peça de madeira maciça com inscrições, usada como parte de uma barreira no século 11.
A viagem continua
E continua ainda mais envolvente, com a Miniatura de Shahnameh e outros desenhos similares, cuidadosamente ilustrados com textos que narram histórias do século 15, que pertenceram à livraria Real de Teerã, e uma série de objetos científicos, como o astrolábio plano do Palácio Golestan, em Teerã, e o curioso astrolábio esférico de Isfahan, do século 11, que representa um globo celeste. Essas peças se relacionam com um painel sobre o saber no mundo islâmico: as aventuras da Casa da Sabedoria, criada em Bagdá no século 9, os feitos do filósofo e médico Avicena, o resgate de Aristóteles pelo filósofo andaluz Averroes, entre outras mentes brilhantes que fizeram florescer essa civilização.
Um cofre guarda os tesouros da ourivesaria, com joias da Síria, do século 11, como brincos de ouro em forma de pássaros, pratas dos tuaregues e uma exclusiva coleção de moedas antigas de várias épocas.
Arte da caligrafia
Em seguida surgem a palavra e a escrita. Nessa sala, está exposta uma coleção de manuscritos e livros que mostram a arte da caligrafia em sua complexidade e riqueza. Um antigo exemplar do século 9 de uma página do Alcorão em letras cúficas, escrito sobre pele de gazela, divide a atenção com as páginas douradas de outro Alcorão do século 17, e um tecido bordado em ouro, que repete o padrão de uma Sura (versículo do Alcorão), vindo do Irã do século 17. Há ainda uma pedra de basalto com inscrições em árabe, talvez um dos mais antigos testemunhos da língua árabe, datada do século 8, e tábuas de escritura africanas, utilizadas na alfabetização e no aprendizado geral, e objetos para talhar e escrever.
“Na caligrafia árabe, as letras adquirem formas distintas, conforme sua posição na palavra, o que permite flexibilidade ilimitada. A caligrafia representa arte extremamente refinada à qual se agregam os arabescos, entre o geométrico e o vegetal. Essa arte alcançou um equilíbrio harmonioso entre as diferentes letras e os padrões decorativos, em todos os seus estilos, desde as linhas retas, angulares, da escrita cúfica (originária de Kufa, no Iraque) à elegância cursiva da thuluth e às curvas proeminentes do estilo diwani”, explica o professor Paulo Daniel Farah.
Tapetes persas
Famosíssimos, os tapetes persas, arte popular levada ao máximo requinte, que sobrevive intacto em cidades como Tabriz e Isfahan, são exibidos ao lado de trabalhos em metal e um nicho dominado por uma armadura de cota de malha de ferro do século 12, usada na época dos Cruzados. Uma vitrine central é dedicada à típica cerâmica azul, comum em todo o mundo islâmico.
A viagem nos leva, ainda, ao interior do Palácio Azem, residência do paxá, governador da Síria durante o período otomano, último dos grandes impérios muçulmanos. Destaque para o mobiliário de poltronas e o baú crivado de madrepérolas, acompanhados por peças de artesanato, roupas e instrumentos musicais feitos pelo mais famoso luthier da Síria na época, Ahmad al-Hariri.
Arte contemporânea
O Centro Cultural Banco do Brasil também apresenta e patrocina a mostra “Miragens: arte contemporânea no mundo islâmico”, de 9 de fevereiro a 3 de abril de 2011 no Instituto Tomie Ohtake. Com curadoria de Ania Rodriguez, é composta por 58 obras de 19 artistas contemporâneos.
Exposição Islã:
Centro Cultural Banco do Brasil
Rua Álvares Penteado, 112, centro. Telefone: 11-3113-3651. De 18 de janeiro a 27 de março. Terça a domingo, das 10h às 20h – entrada franca
O CCBB fica próximo às estações Sé e São Bento do Metrô.
Estacionamento conveniado: Estapar – rua da Consolação, 288, Edifício Zarvos. Do estacionamento, saem vans (transporte gratuito) até o CCBB. Não se esqueça de carimbar o tíquete do estacionamento. Com ele, você paga R$ 10.
Exposição Miragens:
Instituto Tomie Ohtake – avenida Faria Lima, 201, com entrada pela rua Coropés, em Pinheiros. Telefone: 2245-1900.