Centro de São Paulo, esquina da Barão de Itapetininga com 24 de Maio, a duas quadras do endereço mais famoso da cidade – Ipiranga com São João. O marreteiro explica que o DVD de Violeta Foi para o Céu está esgotado. "Terminou, mas consigo para amanhã." Entre ofertas de filmes de pornô e blockbusters como Os Imortais, Sherlock Holmes – Jogo de Sombras e Cavalo de Guerra, quem compra o DVD de um filme chileno/brasileiro sobre a lendária Violeta Parra, autora de Gracias a la Vida e Volver a los 17? "Tem muito chileno e boliviano por aqui", explica o camelô. "Mas, na verdade, todo filme que é inédito vende bem. O povo quer novidade."
Ele promete a cópia do filme "para amanhã" (hoje). A parceira brasileira do produtor e diretor Andrés Wood – Denise Gomes, da BossaNova Films – faz a pergunta que não quer calar. "De onde veio o DVD? Só pode ter sido do Chile." Com estreia inicialmente prevista para maio, o original do filme ainda nem chegou ao Brasil. Será distribuído pela Imovision, que planeja uma série de ações com as empresas produtoras. "Vamos trazer o Andrés ao Brasil, já reservamos espaço na agenda dele." O repórter sugere que tragam também Francisca Gavilán, que faz a cantora e compositora.
Violeta foi uma mulher intensa, apaixonada – e atormentada. Viveu grandes amores. Matou-se num momento de crise. "Francisca é meio bicho do mato. Não quis nem ir a Sundance. Aqui é mais perto, vamos ver se ela vem", arrisca a coprodutora. A BossaNova entrou como parceira depois que a crise retirou a Espanha da lista de associados da Andrés Wood Producciones. A iniciativa de coproduzir partiu da própria Denise. "Gostei tanto de Machuca (NR – o filme mais conhecido de Wood), que entrei em contato com ele e manifestei o desejo de um dia trabalharmos juntos." O dia chegou mais cedo do que ela pensava.
Violeta Se Fue en el Cielos fez compreensível sucesso de público e crítica no Chile. Foi indicado em várias categorias para o Ariel, o Oscar da Espanha. No fim de semana, consolidou a projeção internacional ao vencer a categoria World Drama no Sundance Festival, hoje o maior mercado da produção independente no mundo. A BossaNova produziu documentários musicais, como O Samba Que Nasce em Mim e Tropicália. Violeta foi, é, um ícone da música latino-americana. A BossaNova, até pelo nome, só se interessa por música? "Foi mera coincidência. Não existe interesse em montar uma carteira só com títulos ligados à música." O que fazer agora para conter/enfrentar a pirataria que não atinge só os filmes de massa? O camelô, que não se identifica, oferece um saco de lixo de plástico para que o repórter veja se não há nada ali que lhe interesse. Há Melancolia, de Lars Von Trier, um grande filme de arte. "Esse já vendeu melhor", explica. O filme está há meses em cartaz.
No post que o repórter colocou em seu blog no portal do Estado, surgiram alguns comentários. Felipe Nogueira escreveu – "O filme já está para download na internet, com legenda certinha e imagem de altíssima qualidade. Da lista dos pré-indicados para o Oscar de melhor filme estrangeiro (eram 63), uns 45 estão disponíveis na internet, com legenda e tudo. Hoje em dia está tudo rápido." Denise Gomes tentou localizar o distribuidor Jean-Thomas Bernardini para, pelo menos, antecipar a estreia. "Jogamos para maio, para deixar passar a repercussão do Oscar", ela diz.
Denise acha que não adianta chamar a polícia. "A pirataria não é um fenômeno local. É mundial. De onde veio essa cópia? Nem temos o filme por aqui. Governos estão empenhados em discutir a questão e encontrar soluções. Para mim, ela pode estar na internet paga. Tem gente que quer ver o filme do momento, ou quer ver antes, mas não vai ao cinema. Tenho uma amiga que é contrária à pirataria, mas o filme que queria ver passava só às 2 da tarde, num horário impossível para ela. A solução foi o DVD pirata. Põe na internet paga. Disponibiliza o download, mas com respeito aos direitos autorais. Tenho certeza de que um monte de gente vai pagar."