RIO – Vilão de gibi algum chega aos pés do mal que vem se abatendo sobre o reinado das histórias em quadrinhos de super-herói nas bilheterias de Hollywood: a indiferença do público. Entre as vítimas estão projetos concebidos para faturar fortunas, como "Conan, o bárbaro". O filme de Marcus Nispel estreia no Brasil nesta sexta-feira, seguindo para Argentina e Paraguai, com a esperança de compensar em território latino-americano o desastre que representou no circuito comercial dos EUA.
Surgido em 1932 na revista de literatura pulp "Weird Tales", sob a criação de Robert E. Howard (1906-1936), e importado para os gibis da Marvel em 1970, o guerreiro outrora interpretado por Arnold Schwarzenegger volta às telas na pele do havaiano Jason Momoa numa produção de US$ 90 milhões cuja arrecadação nos EUA, após 20 dias em cartaz, mal chegou a US$ 20 milhões.
De abril até hoje, a espada do fracasso degolou outras três produções com base em HQs. A primeira foi "Dylan Dog e as criaturas da noite", decalcada do best-seller italiano homônimo, cuja revista vende 150 mil exemplares por mês há 25 anos. Em seguida, foi "Lanterna Verde", dirigido por Martin Campbell, de sucessos como "Cassino Royale" (2006), que torrou US$ 200 milhões e arrecadou US$ 116,3 milhões.
Agora, "Cowboys & Aliens", cujo elenco une o 007 Daniel Craig ao Indiana Jones Harrison Ford, sua a camisa há um mês para chegar à fronteira dos US$ 100 milhões na venda de ingressos. Os números indicam que o filão mais rentável de Hollywood na última década encara um esgotamento.
– Quando fica explícita a reprodução em série de uma ideia, o público perde o interesse por tudo relativo a ela – explica ao GLOBO o jornalista James Robert Parish, autor de "Fiasco – A history of Hollywood`s iconic flops", livro que documenta os filmes que fizeram o bolso do cinema americano sangrar. – O grande erro de longas baseados em personagens pouco conhecidos para além dos leitores das HQs é que seus produtores deveriam aproveitar o fato de esses heróis não terem uma mitologia já sedimentada no imaginário popular e criar um novo formato narrativo, explorando abordagens que surpreendam a plateia. É um erro tratar um personagem menos famoso do que Batman ou Homem-Aranha com uma abordagem convencional.
Segundo Parish, Hollywood agora queima os miolos para entender por que mesmo filmes integrados a franquias bem-sucedidas arrecadam menos do que se esperava. É o caso da fornada de lançamentos da Marvel Studios de 2011, que passa longe das receitas astronômicas registradas por longas como "Homem de Ferro", que custou US$ 140 milhões e embolsou US$ 318 milhões em 2008. Na venda de entradas, "X-Men: primeira classe" ficou a US$ 13,6 milhões de empatar os US$ 160 milhões despendidos em sua produção.
Com renda mundial de US$ 448,5 milhões, "Thor", de Kenneth Branagh, deu lucro no mercado americano. Mas os US$ 181 milhões acumulados "em casa" pelo Deus do Trovão ficaram bem aquém do fôlego típico de arrasa-quarteirão (filmes capazes de ir além dos US$ 300 milhões) que se aguardava dele. O mesmo acontece com "Capitão América: o primeiro Vingador", que já levou aos cofres da Paramount US$ 173,4 milhões nos EUA.
Estudando as cifras, analistas de mercado já colocam em xeque o futuro do projeto "Os Vingadores", que une os maiores heróis da Marvel num só filme. Previsto para maio de 2012, o longa vem sendo idealizado há dois anos para se tornar um novo "Avatar" (2009). Agora, seu poder de fogo começa a ser redimensionado.
– Não há hoje entre os filmes de super-herói em cartaz nos EUA um projeto capaz de espantar os exibidores como "Vidas cruzadas" (produção estrelada por Emma Stone e Bryce Dallas Howard e centrada num debate sobre racismo contra empregadas domésticas americanas nos anos 1960). Era um longa do qual nada se esperava e que, de uma hora para a outra, arrecadou quase US$ 140 milhões – diz Parish. – Quando os estúdios pasteurizam sua produção, perdem de vista o fato de que, na arte, não existem equações incontornáveis.
No Brasil, o único super-herói na lista dos dez longas mais concorridos é "Capitão América: o primeiro Vingador", que atraiu mais de 2,8 milhões de pagantes desde 29 de julho.
– Está havendo um aproveitamento das HQs sem critério estético: criativamente, o excesso cansou – diz Paulo Sérgio Almeida, do site Filme B, que avalia as bilheterias no país. – Em 2012, como há novos filmes das franquias "Batman" e "Homem-Aranha" prometidos, os números podem voltar a crescer.
Para não correr o risco de errar de novo, Hollywood promete mudanças. Em julho, durante a Comic-Con, em San Diego, o ator Nicolas Cage animou os fãs ao comentar as novidades do projeto de "Ghost Rider: Spirit of Vengeance". Derivado do blockbuster "Motoqueiro Fantasma" (2007), o longa estreia em fevereiro. Segundo Cage, o tom pop do filme original, massacrado pela crítica, dará lugar a uma abordagem mais sombria.
– Não será uma sequência no estilo clássico. Agora, vamos investir num mundo de pesadelos – disse o ator.
Homem-Aranha também será repaginado em 2012, com Marc Webb, de "(500) dias com ela" (2009) na direção de "The Amazing Spider-Man", que troca Tobey Maguire por Andrew Garfield, de "A rede social", de olho em plateias mais jovens. Sam Raimi, diretor da franquia de 2002 a 2007, saiu por se recusar a dar essa abordagem jovem.
– Procurei fazer um "Homem-Aranha" centrado no impacto que um superser pode causar. E isso, para funcionar numa abordagem realista, precisa ser contado com humor – disse Webb na Comic-Con.
O guardião de Gotham City é outro que retorna em 2012, com "Batman – O Cavaleiro das Trevas triunfa", de novo sob a direção de Christopher Nolan. Vivido por Christian Bale, o Homem-Morcego anda agora no encalço da Mulher-Gato (Anne Hathaway.) Resta saber se alcançará o US$ 1 bilhão arrecadado a reboque da morte de Heath Ledger, em 2008.
Para 2013, espera-se muito niilismo de "Man of Steel", reencarnação do Super-Homem, vivido por Henry Cavill. A direção será de Zack Snyder, polêmico pela abordagem política que imprime em seus longas ("300" e "Watchmen", entre eles). Snyder promete ação para compensar o mel de "Superman – O retorno" (2006), de Bryan Singer, que desagradou aos fãs.
Para evitar delírios de Snyder, a Warner confiou a Nolan a tarefa de atuar como produtor.
– Nolan trouxe uma complexidade adulta que dá aos personagens várias camadas em sua construção dramática – diz o jornalista James Robert Parish. – É o que falta aos outros.