Em Canoas, médicos de equipes de Saúde da Família fazem o pré-natal de gestantes em uma cadeira de dentista. Mais: os consultórios funcionam há mais de sete meses dentro de dois ônibus estacionados no pátio de um Pronto Atendimento no bairro Mathias Velho.
Idosos, a maioria dos pacientes atendidos, sofrem para subir e descer as escadas dos veículos e ainda correm risco de cair e se machucar. Para completar o cenário do que deve ser um local para cuidar da saúde, cães costumam repousar tranquilamente nos mesmos bancos usados pela população.
A situação lamentável foi flagrada pelo Sindicato Médico do RS (SIMERS), durante vistoria a unidades sanitárias da segunda cidade mais rica do Estado, que fica na Região Metropolitana. O funcionamento é mais precário em dias de chuva, porque a sala de espera, improvisada sob um "toldo" de espera, não oferece proteção contra as intempéries. O terreno costuma alagar.
Outra grave deficiência: das cinco equipes previstas para os dois ônibus, três têm médicos, que acabam tendo de se virar para dar conta do dobro da demanda. Um dos efeitos é o cancelamento das visitas domiciliares, atividade crucial do ESF e prevista pelo Ministério da Saúde. Pelo programa federal, a cobertura para cada grupo de profissionais (médico, enfermeiro, auxiliar e agente comunitário) é de 3,5 mil moradores.
A operação no local ocorreu após o despejo das equipes que atendiam no prédio onde agora está o PA Noroeste. "Era para ficarmos um mês até a construção de uma nova sede. Estamos aqui há sete", contam os profissionais. Os ônibus têm logomarca do grupo Mãe de Deus e do programa Brasil Sorridente (CEO). Uma característica das equipes é a alta rotatividade, pois a situação desmotiva muitos a permanecerem e o vínculo é de terceirizado.
Pacientes que vão ao local relatam a situação desumana de atendimento e exigem melhor tratamento. Os profissionais apontam a falta de espaço para fazer procedimentos e examinar mulheres, crianças e idosos. Quando os mais velhos precisam ser atendidos, a solução para não expô-los à insegurança da escada é fazer a consulta num banco sob o toldo, sem privacidade e pisando em cascalhos.
"É no mínimo falta de respeito. Tenho pena dessas pessoas de mais idade. Na cadeira de dentista é impossível fazer exame de toque nas grávidas que já estão nas últimas semanas da gestação", retrata uma médica. O SIMES mediu o tamanho do consultório: menos de três metros quadrados. "O espaço já é limitado para uma pessoa se movimentar, imagina para um médico, uma mãe e um criança", descreve o diretor do Sindicato, Fábio Gatti.