Debaixo d’água tudo era mais bonito/ Mais azul, mais colorido/Só faltava respirar/Mas tinha que respirar.” Esse trecho da música “Debaixo d’água”, composta por Arnaldo Antunes traduz, de certa forma, a sensação do mergulho. Sensação esta que faz a presidente da Fundação Hemominas, a hematologista Anna Bárbara Proietti, substituir, pelo menos duas vezes ao ano, o jaleco pelas nadadeiras, roupa de neoprene e outros equipamentos. “É como se você embarcasse para um outro mundo. Você perde completamente o peso, relaxa. Parece que está voando”, define.
Mergulhadora há 15 anos, ela explica que o esporte entrou em sua vida paralelamente à adolescência dos filhos, Maíra, que na época tinha 14 anos, e Matias, então com 16. Visando integrar a família por meio de alguma atividade, o marido da médica, o epidemiologista Fernando Proietti, sugeriu o mergulho. “Sempre falo para os amigos que não há nada melhor para filhos rebeldes”, brinca. A opção deu tão certo para a família que a filha da médica, hoje com 29 anos, é formada em oceanografia e faz doutorado sobre a vida das tartarugas marinhas.
O esporte é também um meio divertido de reencontrarem o filho mais velho. “Como ele mora em Nova York (Estados Unidos), nos reunimos pelo menos uma vez ao ano para mergulhar e matar a saudade”, explica a médica. Além da proximidade com os filhos, o mergulho proporcionou a Anna conhecer os mares de vários países, como a África do Sul e o Caribe, em excursões promovidas pelas operadoras de mergulho de Minas Gerais. Anualmente, o grupo organiza viagens ao exterior e ao litoral brasileiro. “Os mineiros têm fascinação pelo mar. Então, sempre visitamos a costa de São Paulo e do Rio de Janeiro, mas os meus lugares favoritos são Fernando de Noronha e Abrolhos.”
A preferência da especialista pelas praias do Nordeste tem uma explicação lógica. Quanto mais próximo à Linha do Equador, maiores são a quantidade de vida marinha e a diversidade biológica, por causa das altas temperaturas equatorianas. Segundo o instrutor de mergulho da operadora NDS, Alexandre Baccaro Monteiro, estudar a localização do mergulho é fundamental. “Praia tem pouca visibilidade e geralmente não é a melhor opção. As ilhas são melhores e mais fáceis de mergulhar”, diz.
O interesse no assunto despertou na presidente da Hemominas a curiosidade de ingressar em um curso de mergulho para iniciantes. Conhecido como Discovery Scuba Diving, as aulas teóricas e práticas ministradas pelo instrutor habilitam o aprendiz a mergulhar até 18 metros. Já o nível avançado permite ao mergulhador ficar a mais de 30 metros de profundidade em águas abertas. “No Caribe, é possível descer 40 metros e ainda ver a superfície, além de conhecer as embarcações que naufragaram. É maravilhoso”, lembra Anna Bárbara.
De acordo com Monteiro, o verão é o melhor período para a prática do esporte. Ainda assim, na Região Sudeste, é possível ver a termoclina – uma separação visível nas camadas de água causada pelas diferentes temperaturas desta – em qualquer época do ano. No Nordeste, onde as águas são mais claras durante todo o ano, a visibilidade varia entre 20 e 35 metros. A época ideal para a prática do mergulho é entre junho e agosto.
Os visitantes de ilhas paradisíacas que querem mergulhar, mas não têm tempo de realizar o curso, podem alugar a máscara snorkel e as nadadeiras para praticar, com auxílio do instrutor, o mergulho livre. Já os mais experientes que mergulham com cilindro de oxigênio encontrarão os equipamentos para aluguel por preços que vão de R$ 2,5 mil a R$ 20 mil.
De acordo com a Professional Association of Diving Instructors (PADI), entidade internacional dos instrutores de mergulho, existem pelo menos 300 mil brasileiros praticantes do esporte no País. Ainda de acordo com a entidade, o Brasil é o terceiro país do mundo com maior número de adeptos, atrás apenas dos Estados Unidos e da Grécia.
Etapas
Geralmente, quanto mais profundo o mergulho, menor é o tempo recomendado para permanecer no local, já que o período de descompressão cai à medida que descemos. Por causa disso, a marinha dos EUA e organizações de mergulho internacionais definiram uma tabela com tempo e profundidade correspondentes, calculando quanto nitrogênio é absorvido pelo corpo nesses diferentes níveis. “O curso é dividido em etapas justamente para que as pessoas se adaptem à pressão da água”, explica Alexandre Baccaro Monteiro.
No curso avançado, são os instrutores que mostram como usar as tabelas para planejar o mergulho mais seguro. Os mergulhadores têm ainda medidores que fornecem informações sobre a pressão do ar no cilindro, a profundidade a ser percorrida e uma bússola para navegação. Para impedir que mergulhadores com pouca experiência realizem submersões além da profundidade permitida, um certificado de instituições brasileiras e norte-americanas comprova o conhecimento do esportista em águas abertas.
A carteirinha é, geralmente, entregue pelas escolas de mergulho e deve ser apresentada sempre que o profissional solicitar equipamentos para as atividades, como o cilindro de ar. Medidores de informações e computador de mergulho de pulso são indispensáveis para quem vai praticar o Self-Contained Underwater Breathing Apparatus (SCUBA) – dispositivo para respiração subaquática autocontido, em tradução livre. Para esse tipo de atividade, o mergulhador utiliza máscara para os olhos e o nariz.
O mergulhador adquire, ainda, nadadeiras, para ter agilidade durante a submersão. Alguns acessórios também podem ser carregados, como a faca de mergulho para se livrar do equipamento caso este se enrosque em algum objeto, pedras etc., e a placa de ardósia, utilizada quando os mergulhadores precisam se comunicar. “Tendo o básico, como nadadeira, máscara, regulador e roupa neoprene, só alugo o tanque no local, porque ele é pesado e ruim de carregar”, diz a hematologista.
Onde mergulhar
Com aproximadamente 9 mil quilômetros de litoral, o Brasil oferece diversas opções para os adeptos do esporte. No Rio Grande do Norte, por exemplo, as barreiras de corais conhecidas como Parrachos de Maracajaú atraem turistas e ficam a 7 quilômetros de distância da costa, em relação a Natal. Já em Recife, considerada capital brasileira dos naufrágios, os mergulhadores podem apreciar no fundo das águas cristalinas navios de vários tamanhos e épocas. Na Região Sudeste, o litoral do Rio de Janeiro oferece pontos de baixas e altas profundidades, como o Arraial do Cabo, Búzios e Paraty. Em São Paulo, Ilha Anchieta, Arquipélago de Alcatrazes, Ilhabela e Laje de Santos são os principais pontos. Já no Sul, o destaque fica para Santa Catarina e o arquipélago situado na Reserva Biológica Marinha do Arvoredo, administrada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). Lá, os mergulhadores encontram grande quantidade de vida marinha, além do cargueiro Lili, afundado em 1958.