Nota política do Sindicato
Ainda hoje pouco debatida, a saúde da mulher lésbica e bissexual se mostra um assunto impreterível, com urgência a ser estudado e aprofundado no Brasil.
A escassez de literatura científica sobre o assunto e a ausência de um sistema nacional de coleta de dados em saúde que leve em consideração especificidades sobre essas mulheres é reflexo do descaso e estigma a que estão submetidas. Mais do que isso, o silêncio no campo científico reforça a ignorância, o senso comum e as várias violências que assinalam o cotidiano da mulher lésbica e bissexual de maneira dramática.
Sobre o modo de vida dessa parcela da população, é necessário destacarmos algumas tendências a fim de compreendermos melhor seu processo saúde-doença. A tendência à violência é uma delas, podendo estar presente desde a infância, de maneira tácita como quando os primeiros núcleos de socialização impõe normas e comportamentos fundados na heterossexualidade, ou de forma mais brutal como nos casos de estupro corretivo. Não à toa, 61% das mulheres lésbicas informam terem sofrido algum tipo de violência por causa de sua orientação sexual¹. Muitas dessas violências são socialmente aceitas, como manifestações de lesbofobia e bifobia durante os trotes universitários, demonstrando que estão organicamente ligadas às relações hierárquicas construídas nesses espaços.
Outra tendência que merece destaque é a superexploração da força de trabalho dessas mulheres: menores salários, menos oportunidades de promoção para melhores cargos, maior chance de realizar trabalhos informais, maior chance de sofrer assédios e discriminações. Não à toa, somente 38% das mulheres LBT afirmam explicitamente sua orientação sexual no ambiente de trabalho, ainda que 65% estejam confortáveis com sua sexualidade, justamente por medo de que isso interfira negativamente em seu trabalho². Cabe ressaltar que, assim como as mulheres heterossexuais, as mulheres LBT também estão submetidas à dupla jornada de trabalho sendo responsabilizadas pelas atividades de cuidados com a casa e com familiares.
Apontar tal cenário é necessário para que a comunidade médica compreenda mehor as necessidades dessas mulheres e também suas demandas, mesmo as mais básicas -, como o acesso ao aborto legal, seguro e irrestrito; a possibilidade de compreender a própria saúde; conhecer o próprio corpo e suas potencialidades; entender os riscos à saúde que lhes são particulares; acessar e ser capaz de realizar com responsabilidade e devidos cuidados a hormonioterapia e outros processos de afirmação de gênero e sexualidade; entre tantas outras demandas.
Assim, lembramos e celebramos hoje o dia do Orgulho e da Visibilidade Lésbica, ressaltando a necessidade de se conhecer as particularidades de saúde das mulheres LBT brasileiras a partir de uma perspectiva científica comprometida em fornecer as bases teóricas para subsidiar uma prática direcionada para a transformação social.
Só avançamos quando nos organizamos, pensamos e lutamos coletivamente!
Fontes:
¹ Carvalho, M. F. L., & Menezes, M. S. (2021). Violência e Saúde na Vida de Pessoas LGBTI. Editora Fiocruz. ISBN (impresso): 978-65-5708-045-0, eISBN (digital): 978-65-5708-120-4
² Apenas 30% das mulheres LGBT se assumem em ambiente de trabalho, diz pesquisa. Agência O Globo. 8 de março de 2020. Disponível em:
https://revistapegn.globo.com/Dia-a-dia/Gestao-de-Pessoas/noticia/2020/03/apenas-30-das-mulheres-lgbt-se-assumem-em-ambiente-de-trabalho-diz-pesquisa.html